Neste terceiro episódio tenta-se fazer sentido - e ciência - das grandes (e legítimas) problemáticas que rodeiam a pandemia de CoViD-19, bem como das questões que - ainda que mirabolantes - não se sustêm contra o crivo da ciência.
Máscaras, 5G e Guerra Biológica.
Esta é a versão escrita do Podcast Vox Modum
Máscaras
O uso de máscara durante uma situação de pandemia apresenta-se, provavelmente, como o maior ponto de disputa entre profissionais médicos e de saúde.
Por um lado, diversas facções médicas e mesmo governamentais dispersas pelo mundo apoiam - na verdade - requerem dos seus cidadãos o uso de máscara aquando em público. Por outro, a OMS (Organização Mundial de Saúde), mantém, à data de emissão deste podcast, a posição que o uso de máscaras se deve cingir unicamente a situações de potencial contacto direto.
Resta, então, tentar fazer sentido de toda a informação e contra-informação disponibilizada (em massa) nos meses em que o CoViD-19 se tem espalhado pelo globo.
Antes de mais, há que dividir, não entre apologias ou detratores do uso de máscara, mas, de entre aqueles que se apresentam contra, as razões pelas quais o fazem.
Comecemos por esclarecer as diferenças importantes sobre os tipos de máscara em uso e discussão durante a pandemia.
Antes de mais, temos a classe dos respiradores. As máscaras N-95 ou FFP podem ser classificadas como máscaras mas, devido à sua construção e aparato de filtração, são considerados numa classe e nível de proteção superior. De facto, as máscaras N-95 obtém o seu nome pela capacidade de filtração de 95% de matéria aerossol (partículas no ar). Estas máscaras são utilizadas em ambiente hospitalar em condições excepcionais - como a pandemia de CoViD-19.
As máscaras cirúrgicas, constituídas pelo popular TDT (tecido-não-tecido), são as máscaras de uso corrente em ambiente hospitalar e tem vindo a tornar-se lugar comum na Ásia desde o meados da primeira década do século XXI, devido ao aumento da poluição atmosférica, e espalham-se agora pelo mundo, durante esta pandemia.
Antes de mais, TDT é simplesmente um material com as características de um tecido (porosidade específica) que não é obtido por meio de malha. Ou seja - o tecido não é tecido. Essencialmente, é um composto plástico - geralmente poliuretano.
Ambos estes tipos de máscara, no entanto, possuem um limite de utilização. Nas melhores condições, tanto respiradores como máscaras cirúrgicas, limitam-se a uma única utilização (com a salvaguarda de que o tempo de vida útil de um respirador é muito superior). E mesmo assim, há que ter em conta que o aparato de filtração de um respirador pode entupir por acumulação de partículas e ser prejudicial ou mesmo nocivo àqueles que sofrem de condições respiratórias, nomeadamente DPOC (doença pulmonar obstrutiva crónica) ou Asma.
Tecnicamente, máscaras cirúrgicas podem ser lavadas. Contudo, nenhuma recomendação oficial será provavelmente lançada neste sentido já que, ainda que uma lavagem possa eliminar o SARS-CoV-II, outros tipos de patogéneos podem manter-se na superfície, com a agravante que, devido ao processo de fabrico e as características inerentes do plástico (poliuretano) que as constituem, a temperatura elevada da lavagem as possa danificar ao ponto de se tornarem inúteis.
Isto deixa-nos, então, a ponderar o último tipo de máscara - ou proteção respiratória - que tem sido discutido nos últimos meses. A chamada “máscara de uso comunitário”.
Ainda que existam três linhas de pensamento sobre o material e construção destas máscaras, comecemos por estabelecer algo que por vezes não é deixado claro. Uma máscara, uma viseira (a qual irá ser referida à frente), um fato protetor ou luvas são barreiras mecânicas. Protegem o ser Humano da mesma forma, no nível mais básico, que a pele o faz. Oferecem uma barreira mecânica - uma parede - que pode prevenir o contacto direto com o vírus. Existe, porém, uma questão que tenho a certeza inquieta alguns.
Como passa o ar e fica o vírus. E esta é a questão fundamental da problemática das máscaras. Ainda que seja complexo visualizar diferentes tamanhos no mundo microscópico, tendo em conta que o melhor microscópio ótico é incapaz de observar vírus (devido a propriedades da própria luz), temos de ter em consideração que um vírus tipicamente existe na escala dos 100 nm (nanómetros) - cerca de dez milhões de vezes menor que um metro, as pequenas moléculas, por outro lado, como o oxigénio molecular que respiramos, são cerca de 100x menores ainda. Não só isto significa que o oxigénio que respiramos é um milhar de milhão de vezes inferior ao metro (sim, bastante!) mas também que é microscópico o suficiente para, entre outras coisas, atravessar a membrana alveolar pulmonar no fenómeno tipicamente chamado respiração.
Quedam daqui algumas questões. Primeiramente: Não! - o uso de máscaras cirúrgicas ou de uso comunitário não causa dispneia ou qualquer outro tipo de dificuldade respiratória. A sensação de “abafamento” descrita por muitas das pessoas que a usam prende-se simplesmente à falta de hábito de respirar num ambiente altamente saturado de vapor de água, quente e húmido. Isto deve-se apenas à acumulação gradual (e inócua) de vapor de água da própria respiração entre a máscara e a boca. Não seria diferente tentar respirar numa Selva, e certamente é pior tentar fazê-lo numa sauna.
Ou seja, o problema da passagem de oxigénio não se coloca. Aliás, a diferença de dimensões é tanta que afirmar que a Torre Eiffel poderia atravessar uma porta apenas porque um humano médio é capaz de o fazer se torna uma metáfora apta.
Existe, porém, a preocupação que, em máscaras não produzidas mediante métodos comprovados e testados - e sujeitas a rigorosos testes de aprovação, como é o equipamento médico - a porta possa ser grande o suficiente para a Torre. Ou no caso, o CoViD-19.
Voltemos às três linhas de pensamento sobre o fabrico das máscaras de uso comunitário. Essencialmente, aquelas produzidas exclusivamente de TDT, as mistas (tecido normal e TDT) e as mais básicas, uma simples barreira mecânica de tecido - preferencialmente 100% algodão: isto é a recomendação mais ouvida, supõe-se devido aos valores de dimensão da “malha” e taxa de passagem de ar serem os mais semelhantes às mascaras de TDT, se bem que a informação é escassa.
Cada um destes sistemas apresenta os seus problemas. Primeiramente, as máscaras exclusivamente de TDT construídas em ambiente doméstico ou de grau não-médico apresentam todos os problemas (e vantagens) acima descritos com a agravante da falta de supervisão e standard de manufação.
As máscaras de algodão sofrem da capacidade inata do tecido de acumular vapor de água, facilitando largamente o acoplar de gotículas infetadas e permanência do vírus na sua estrutura - podendo depois ser transmitido caso o tecido venha a contratar com a boca.
As máscaras mistas, essencialmente, apresentam-se como uma alternativa na qual o filtro TDT (e sim, os filtros de café são TDT) pode ser descartado e a estrutura da máscara lavada e reutilizada.
Contudo, as questões da eficiência e eficácia de todas estas soluções, sobretudo se administradas num ambiente no qual o seu melhor uso não é possível, ou então mesmo conhecido, podem levar a aumentos indesejados da “falsa sensação de segurança” repetidamente referida pela DGS (Direção Geral de Saúde). A acrescentar a isso, os recursos limitados para a produção de máscaras N-95 e cirúrgicas tem de ser garantidos para aqueles que absoluta e imperativamente necessitam delas - profissionais de saúde e aqueles que se encontram na linha da frente.
Reitera-se: o uso de máscaras, viseiras, luvas etc. é completamente irrelevante se não for combinado com um sólido sentido de distanciamento social e a higiene regular e profícua das mãos.
Para o cidadão comum, aliás, o uso de luvas é fortemente desaconselhado, pois a sua utilização é mais complexa e específica do que se possa imaginar, e o seu uso aumenta o risco de contágio.
Para terminar, então… o que fazer de tudo isto. Serão as máscaras eficazes?
Os números relativos à pandemia de CoViD-19 são muito escassos e pecam por falta de análise e processamento. Contudo, estudos realizados na Ásia relativamente às epidemias de gripe sazonal demonstram eficácias no conter da transmissão na ordem dos 70-80%. Também durante a epidemia de SARS (Síndrome Respiratório Agudo e Severo) foi razoavelmente estabelecido que o uso de máscara é um meio eficaz de controlo da propagação. E, provavelmente, pela questão que ainda não falamos. As máscaras, mais que protegerem o próprio, são excelentes barreiras para proteger os outros. A mesma parede que é eficaz a manter fora, é-o ainda mais a manter dentro. E, sobretudo numa pandemia onde estudos recentes apontam um número de infetados muito superior ao registado, devido à ausência quase total de sintomas em muitos pacientes, as máscaras tornam-se uma ferramenta valiosa. Qualquer máscara. Qualquer barreira mecânica.
Para não sermos especulativos, analisemos o caso da República Checa e Áustria, países onde o CoViD-19 foi identificado sensivelmente na mesma data, e que partilham proximidade geográfica e climatérica, enfrentando agora números muito diferentes. Ainda que os números não sejam milagrosos, todos os países que forçaram o uso generalizado de máscara (República Checa, Singapura, Hong Kong, Taiwan) tendem a ter dispersões de propagação largamente mais positivas que aqueles que optaram não o fazer.
5G
Falemos agora da impressionante problemática do 5G. Como ávidos utilizadores de dispositivos móveis, certamente estamos cientes dos conceitos de 3 e 4G, as duas normas de serviço celular em uso atualmente. A quinta norma, o 5G, é agora alvo de uma controvérsia inexplicável.
Em ciência existe uma aversão monumental em declarar que algo é impossível. Afinal, no campo teórico, é possível que a qualquer momento o campo de Higgs sofra uma flutuação aumentando a entropia do universo de tal forma que parte dele simplesmente colapsa para fora da própria existência.
Contudo, tentarei ser claro. Estou tão absolutamente confiante que 5G não transmite CoViD-19 como estou certo que se abrir a minha janela e saltar não voarei, mas a gravidade tratará de me precipitar 3 andares até ao chão.
No exercício provavelmente fútil - mas ainda assim, académico, de entreter esta ideia peregrina, pensemos que, antes de mais, existem dois tipos de 5G diferentes. Qual deles será o responsável? Ambos emitem em espectros previamente utilizados. O chamado 5G “lento” ou sub-6, emite numa frequência essencialmente paralela ao WiFi, e o 5G “rápido” emite na chamada mmWAVE ou “onda milimétrica” e sim! Este comprimento de onda é novo no uso comercial. Deve ser este, deve ser o perigoso. Excepto que este espectro de emissão é usado largamente pelas plataformas de comunicação militar e de aviação. Aliás, o progresso do 5G foi quase parado na índia devido a interferências com o equipamento militar indiano.
Mais, e peço que tomem comigo o comprimido vermelho, o espectro de emissão do mmWAVE é tão relativamente próximo à radiação visível que o seu comportamento é semelhante no que diz respeito a dispersão. Árvores, prédios, postes, o próprio corpo humano é tão opaco ao mmWAVE que esta basicamente é incapaz de percorrer mais de 30 metros numa cidade. Considerando a escassez de implementação de mmWAVE 5G, gostaria de ser o primeiro a afirmar que efetivamente é este o modo de transmissão. Já estaria tudo resolvido.
Por favor. Não saia à rua nem ao Facebook a pedir a queima ou desmantelamento de antenas 5G. Porque senão, tenho de, na minha melhor opinião científica, de pedir a todos para eliminarem tudo o que emite radiação do espectro eletromagnético. Isto inclui:
Telemóveis, claro;
Televisões;
Frigoríficos e computadores;
O sol;
Árvores!
Todos os animais de estimação;
Bebés…
Guerra biológica
Foquemo-nos agora nas mais sérias acusações da pandemia. Que se trata de uma guerra biológica.
Antes da exploração científica, peço um momento para reflexão. A CIA, MI6, Mossad, KGB e toda a quantidade sem fim de agências e agentes especiais não conseguiram, até à data, associar esta pandemia a qualquer tipo de ação humana.
Milhares de cientistas, espalhados pelo mundo, estudam este vírus à meses. Uma equipa australiana publicou uma análise completa do genoma (material genético) do vírus semanas depois do seu anúncio e ninguém conseguiu, até à data, associar o vírus a qualquer tipo de ação humana.
O fenómeno de Occam’s Razor descreve que, na maioria das situações, a explicação mais simples é a correta. No ensino da medicina é ensinado para procurar cavalos, não zebras. Procurar o que é simples, óbvio, observável.
Nada aponta para que o CoViD-19 seja uma fabricação humana - ou mesmo uma modificação que tenha corrido mal.
Basta analisar a proveniência dos rumores para identificar uma clara guerra de acusações entre Estados Unidos e China. Aliás, o primeiro rumor a ganhar relevância originou-se na plataforma WeChat, e apontava que o CoViD era um vírus introduzido em solo chinês pela CIA.
No entanto, toda a evidência já coleccionada sobre este vírus aponta para um facto muito simples. Existiu uma zoonose entre espécies e o ser humano foi contagiado por exposição a tecidos infetados de um animal.
Aliás, todo o alarido e especulação em torno da origem do CoViD-19 distrai a atenção do local onde ela deveria estar absolutamente focada. A origem do Coronavírus que se espalha agora pelo mundo pode ser localizada a um mercado específico em Wuhan, na China. As políticas de higiene, as práticas de consumo, toda a permissão e legislação em torno daquilo que é possível capturar, negociar e consumir na China deixa portas abertas à propagação de variadas doenças - sobretudo os Coronavírus. SARS, MERS e agora CoViD-19. Todas estas epidemias surgiram em condições semelhantes nos “wet markets” da China.
O jogo das culpas é irrelevante, o racismo contra a população chinesa é irrelevante. Apenas os factos científicos têm relevo, agora. A distração do jogo de acusações que vivemos tem de cessar. Sabemos onde o CoViD-19 começou. E os jogos de política e desinformação apenas abrem a porta ao esquecimento do porquê desta pandemia ter começado, e como evitar que se repita.
A informação é, quando todos os outros mecanismos de resposta falham, a única corda que pode guiar e informar as decisões que indivíduos, corporações e governos tomam.
Preservê-mo-la.
by NOVI,
Texto de Pedro Sousa
Fontes:
Comments